O Mito do Domínio do Cérebro
O conceito de que temos total controle sobre nosso cérebro, e portanto do conteúdo da mente, é um dos grandes tabus da humanidade, e a causa do preconceito sobre os portadores de distúrbios psiquiátricos, que ao longo da historia da humanidade foram tratados como ”fracos”, “incapazes”, filosofias e religiões inteiras foram desenvolvidas para nos ajudar no controle da mente.
Quando passo numa livraria e vejo a quantidade de livros de autoajuda que ensinam como controlar nossas emoções e mesmo nossos pensamentos, sempre tenho a ideia de que se isso fosse realmente possível, apenas um deles bastaria.
Indivíduos que apresentam síndrome do pânico, transtorno obsessivo compulsivo, depressão, esquizofrenia, etc, sofrerem duplamente: Pelos sintomas em si, e pela frustração de não conseguirem controlar suas mentes.
Muitos despendem uma energia enorme nesse processo, buscam todos os tipos de ajuda e alternativas, o que por vezes só serve para aumentar o nível de frustração em que vivem, o que resulta inclusive na piora do quadro.
É difícil entender que a principal função do cérebro seria a defesa da espécie através da sobrevivência dos seus indivíduos, portanto se a mente acredita que exista algum perigo no meio externo, ou dentro do próprio grupo que convivemos, ele passa a funcionar pela lógica da sobrevivência e portanto “desligará” nossa capacidade de autocontrole, resultando nas inúmeras síndromes psiquiátricas. É como se a mente não confiasse na nossa capacidade de discernimento sobre a real dimensão do perigo que nos ronda.
Interessante recordar que milhões de anos separam os primórdios da historia humana e a civilização em que vivemos, portanto comportamentos ligados a nossa defesa estão solidamente impressos no nosso cérebro através de estruturas próprias, que iremos explicar adiante.
Chego a pensar que boa parte dos distúrbios psiquiátricos modernos, foram comportamentos úteis num mundo pré-histórico , e por isso por vezes ligados a uma genética dominante.
A ansiedade e o pânico que hoje faz sofrer, foi a salvadora dos nossos antepassados, que lutavam contra terríveis tigres de dentes de sabre.
O tão desejado equilíbrio emocional, passa por um funcionamento adequado do cérebro, com o predomínio das áreas superiores mais novas em termos evolutivos, sobre as mais primitivas. Quando essas áreas instintivas responsáveis pelos mecanismos básicos de defesa, deixam de ser controladas pelo córtex, teremos uma pessoa com constantes acessos de ansiedade e consequente processo depressivo. Uma das principais estruturas que estão relacionadas a sinalização do perigo externo são os corpos amigdaloides, também conhecidos como as amígdalas cerebrais. Esses órgãos em formato de pequenas amêndoas são bastante primitivos, ou seja, estão presente desde animais mais primitivos como repteis e peixes, e participam dos processos de defesa instintiva básica.
Ao longo da evolução, quando nos tornamos humanos civilizados, passamos a ter maior controle sobre as áreas de defesa básicas, que veem em forma de desenvolvimento do chamado cortex prefrontal, aonde possivelmente se dá o processo do pensamento racional (exclusividade humana).
O controle do medo pela razão pode ser bastante prazeroso, vide, por exemplo, certos esportes de aventura e emoção como por exemplo pular de bungee jumping. Só o ser humano consegue fazer isso porque é capaz de desafiar seus sentimentos mais primitivos.
As amigdalas cerebrais e a origem do medo
Os corpos amigdaloides estão mais ativos nos pacientes com estados depressivos ansiosos, segundos pesquisas feitas com modernos aparelhos de ressonância magnética funcional.
O núcleo amigdaloide na verdade não é uma estrutura homogenia, sendo formada por grupos de neurônios que recebem influencia química de hormonios e peptídeos (pequenas moléculas sinalizadoras) de modo a moduar o medo e a ansiedade.
Entre os sinalizadores químicos que influenciam a atividade das amigdalas temos neuropeptideos que são influenciados pelo nível de saciedade de modo que a satisfação do apetite acalmaria o corpo amigdaloide, o que explicaria a relação da ansiedade com a obesidade, e vice e versa, a fome leva ao aumento da agressividade pela ativação da amigdala.
Uma particularidade interessante é que parece existir uma diferença entre a ação da amigdala direita versus a esquerda. Enquanto a direita parece reagir a rostos de aspecto hostil, a esquerda é ativada por estímulos contextuais. Um trabalho realizado pela Universidade de Berlim demostrou ativação da amigdala esquerda pela leitura de livros do Harry Poter (estórias sobrenaturais).
No sentido contrario, sabemos que pacientes que apresentaram alguma lesão nos corpos amigdaloides podem passar a apresentar comportamentos anormais, tipo perder o medo de animais peçonhentos, chegando a, por exemplo, colocar aranhas na boca.
Outra constatação interessante é que indivíduos diagnosticados como personalidades psicopáticas (Pessoas que não apresentam sentimento de medo ou compaixão para com os outros, sendo inclusive assunto bem explorado nas telas dos cinemas) apresentam atrofia importante dos corpos amgdaloides.
O hormônio ocitocina que é liberada pela glândula hipófise, pela ocasião de quando vemos um rosto de alguém que confiamos ou que amamos, tem afinidade pelas células da amigdala, e contribuem para diminuir a da atividade da mesma.
Pessoas extremamente tímidas sofrem por apresentarem uma espécie de hipersensibilidade da amigdala direita, de modo que vivem em estresse permanente, uma vez que a vida moderna requer a interação constante com todo o tipo de pessoas.
Na tabela abaixo temos uma referencia simplificada da relação dos corpos amigdaloides com estados emocionais e a patologia psiquiatrica.
A chamada estimulação magnética transcraneana, é um procedimento terapêutico recentemente estabelecido para a melhora de quadros depressivos que não respondem a medicações antidepressivas ou a psicoterapia.
Muitas pesquisas ainda estão sendo feitas para se estabelecer o real potencial desta técnica nos quadros de ansiedade e síndrome do pânico bem como nas diversas síndromes psiquiátricas.
A técnica consiste basicamente em estimular, via ondas magnéticas, o córtex pré frontal desses pacientes, no sentido de provocar o domínio de áreas importantes para o controle dos corpos amigdaloides, usando para isso, o processo físico. Numa comparação mais grosseira, seria como recuperar um músculo que se encontra paralisado e atrofiado, através de estímulos elétricos aplicados diretamente sobre o mesmo.
Ao longo do tempo, e com as inúmeras sessões de estimulo, o resultado terapêutico se daria pela volta da hierarquia cerebral, do controle do racional, sobre o medo e a ansiedade sem um real motivo.